Mãe Stella de Oxóssi, uma vida dedicada ao axé.

O envolvimento em projetos e atividades fez o tempo passar mais rápido. Com a mente em estado permanente de ebulição, aos 93 anos completados em maio, a ialorixá do Ilê Axé Opô Afonjá, Maria Stella Azevedo Santos, não deixa de fazer planos e de viabilizá-los.
"É gostoso viver. Nasci com cinco meses e meio. Estava com pressa de vir ao mundo. Às vezes me pergunto se vou fazer essa idade mesmo", brinca Mãe Stella de Oxóssi.
Hoje, o dois de maio iniciou ao som de clarins e alvorada de fogos na entrada da casa da sacerdotisa. Como o sábado é dedicado a Oxum e a Iemanjá, foi com elas que Mãe Stela começou o dia. "Todos os dias, meu primeiro contato é com o sagrado, ajoelhada e agradecendo", contou.
Em seguida, o café da manhã ocorre na Casa de Xangô, em tom de confraternização como as demais refeições ao longo do dia. O encerramento dos festejos foi na área externa do templo, a partir das 19h, com música, coquetel e mais homenagens para a suma sacerdotisa do Afonjá.
Como presente, pede para seguir sua missão. "Desejo deixar uma obra interessante e um lugar que sirva de parâmetro de alegria e equilíbrio para quem procure. Anseio que as pessoas se respeitem. A bondade e a verdade são obrigações de toda a humanidade", afirma a líder espiritual.

Trajetória:
O espírito de liderança aflorou ainda na infância. "Adorava a hora do recreio. Era uma roça e eu sempre puxava as brincadeiras com meus amigos", contou.
A habilidade para cuidar de vidas também não tardou. Mãe Stella se formou em enfermagem pela Escola Baiana de Medicina, área em que se aposentou - e ampliou o sentido desse cuidado ao se tornar ialorixá em 1976. É a quinta na sucessão do terreiro já comandado por Eugênia Anna dos Santos (Mãe Aninha - fundadora em 1910), Mãe Dadá, Mãe Senhora e Mãe Ondina.
Iniciada por mãe Senhora, aos 13 anos, Mãe Stella sempre atuou na preservação da religião e contra o sincretismo. Em 1983, liderou um manifesto em defesa do fim da prática.
"Hoje minha dedicação é exclusiva ao cuidado de vidas e das divindades. Tenho um santo maravilhoso. Oxóssi tinha que ser meu pai e eu nasci para ser filha dele. Tem gente que vem aqui, segura na minha mão, pede um abraço e fico feliz em causar esse impacto", disse.
O retorno também é garantido pelos filhos e filhas de santo que se revezam no zelo com a mãe. "Não sei o que é desgosto. As pessoas me tratam bem e se preocupam muito comigo".
Além do cuidado mútuo, o dia a dia na casa localizada no território sagrado não tem rotina. "Aqui ninguém morre de tédio. Aprendemos e brincamos muito com ela", contou Graziela Domini Peixoto, filha de santo do Afonjá. A explicação está na dijina (nome sagrado) da ialorixá que é Odé Kayodê (Caçador da Alegria).
"É uma emoção a cada meia hora", brinca Mãe Stella. "Gosto de conversar, pois aprendo muito com pessoas de todas as idades. É com os mais jovens que me atualizo", explica Mãe Stella.
As madrugadas também são produtivas. "Ela costuma acordar e lembrar de mitos, músicas, faz traduções. O gravador está sempre pronto", disse Graziela.
Foi em uma situação como essa que surgiu a música-tema do mais novo sonho de Mãe Stella. Desde junho deste ano, o Afonjá abriga o Brincadeira tem hora. Um domingo por mês, crianças e adultos têm um dia de recreação. "A ideia não é fazer as crianças brincarem como antes. É apresentar as brincadeiras e contar a história e a simbologia delas", afirmou Mãe Stella.
Ela citou a cama de gato, que consiste em desfazer armações de um barbante entre dois participantes. "Com ela se aprende que o seu problema pode ser resolvido com a ajuda do outro". Ainda este ano também será lançado o DVD Folha ENcantada, baseado no livro  O que as Folhas Cantam (para quem canta folha), de 2014.
A postura ao longo da história de vida da sacerdotisa expõe mais uma característica do orixá ao qual foi consagrada: como caçadora que é, vê bem longe e vai somando um vasto legado.

Religiosa é a quinta na sucessão do terreiro Ilê Axé Opô Afonjá.

Extraído e atualizado da publicação da Ag. A TARDE.


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