Pai de santo se forma em Direito vestindo toga branca em Bagé: 'Não posso usar a cor preta'

Alessandro de Quadros se graduou pela Urcamp. Beca diferente das usadas pelos demais formandos foi autorizada pela instituição. Reitor disse que universidade "jamais agiria com intolerância religiosa"
Alessandro de Quadros se graduou pela Urcamp. Beca diferente das usadas pelos demais formandos foi autorizada pela instituição. Reitor disse que universidade "jamais agiria com intolerância religiosa".

A formatura é um momento simbólico para qualquer estudante, seja pela conclusão de um ciclo importante na vida acadêmica, seja pela emoção do evento em si. Para um pai de santo de Bagé, na fronteira com o Uruguai, a cerimônia de graduação em Direito teve um significado ainda mais especial: ele foi autorizado a usar uma toga branca.

A beca tradicional é preta. Contudo, Alessandro de Quadros, de 25 anos, não usa itens dessa cor por causa da religião. Após uma conversa com a coordenação do curso, professora Lourdes Helena Martins, a reitoria do Centro Universitário da Região da Campanha (Urcamp) atendeu o pedido do formando.

"Eu sou filho de Oxalá, então eu não posso usar a cor preta. Eu fiz um pedido de quebra de protocolo, falei com a coordenadora do curso. Ela me recebeu de braços abertos", diz Alessandro.

A formatura ocorreu na noite de sábado (10). Alessandro recebeu o diploma ao som da música "Povo de Santo", de Luciano Bom Cabelo e João Martins (veja o vídeo acima). O refrão da canção diz: "mas por favor, respeita meu Orixá; respeita o povo de santo, que eu respeito o seu altar".

O reitor da Urcamp, professor doutor Guilherme Cassão Marques Bragança, disse ao g1 que "a instituição é laica, assim como o Estado". Ele acrescenta que "é constitucional o respeito a todas as religiões e suas particularidades. Assim sendo, o pedido foi deferido porque é um direito legal e jamais a Urcamp agiria com intolerância religiosa" (leia a íntegra da manifestação abaixo).

O bacharel em Direito é seguidor da Umbanda, uma religião afro-brasileira que sintetiza o culto aos Orixás. O Rio Grande do Sul é o estado brasileiro com o maior percentual de adeptos de religiões de matriz africanas. Mesmo assim, a fé ainda é alvo de preconceito, como diz Alessandro.

"Nós, que vivemos na religião, vivemos preconceito no dia a dia. Dizem que é exibicionismo, querer chamar atenção. Mas quem sabe a realidade sabe como é discriminado", afirma o pai de santo.

Alessandro conta que ingressou na religião aos nove anos de idade, acompanhando a mãe. Após um período afastado, na adolescência, voltou a se dedicar à Umbanda, se tornando pai de santo na virada de 2019 para 2020. No Direito, foram cinco anos de curso.

"Foi sempre uma área que eu gostei. Amo Direito Penal, por exemplo", conta.

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